Ninguém nasce sonetista
Escrevo este texto para as pessoas que estão aprendendo a fazer sonetos, sobretudo. Começo dizendo que ninguém nasce sonetista, mesmo que tenha muito talento para escrever poemas em versos brancos. Talento não se ensina, mas técnica pode ser ensinada. Comecei a escrever meus primeiros versinhos aos 9 anos de idade. Escrevi de forma intermitente por longos anos. Fui muito danada e brinquei muito. Papai é sonetista (Antonio Lycério Pompeo de Barros) e sempre declamou os seus poemas e sonetos para nós, seus filhos. Colecionava – e ainda coleciona – em um caderno capa dura, os sonetos que admira, todos anotados à mão. Foi através dele que conhecemos e, posteriormente, nós, seus filhos, lemos, os clássicos da literatura brasileira e, depois, estrangeira. Quando os meus professores foram falar deles nas aulas de literatura, eu já havia lido suas obras, porque fui criada com as famosas “coleções de capa dura” de José de Alencar, Eça de Queiroz, Monteiro Lobato, Jorge Amado, Malba Tahan e tantas outras. Aqui em casa ainda conservo algumas coleções, como os livros ilustrados da Divina Comédia, Shakespeare, Aluízio de Azevedo, José de Alencar, Sermões de Padre Vieira, Machado de Assis. São heranças da passada infância: todos nós, os 5 filhos, lemos as coleções, sob sua orientação. No segundo grau participei de alguns concursos literários, muitos dos quais obtive o primeiro lugar. Mas a vida me afastou da escrita de poemas, mas não da escrita. Desde o meu ingresso na Universidade de Brasília, onde cursei o bacharelo em Ciências Sociais e o mestrado em Antropologia, encantei-me com os estudos sobre os povos pré-colombianos, os povos indígenas. E passei a estudar e a pesquisar na área de etnologia indígena. Tornei-me professora de Universidade, fiz doutorado na USP e depois o pós-doutorado. Escrevi livros, artigos, parte de livros, porém todos acadêmicos. Escrevi alguma poesia aqui e ali, em versos brancos. Em 2008 resolvi entrar para o Recanto das Letras e lá postar meus poemas para salva-los de mim, pois já havia queimado todos os meus escritos anteriores. Em março de 2009 resolvi seguir o caminho de meu pai e aprender a fazer sonetos para dar a ele essa alegria. Entrei para um fórum dedicado a sonetos no Recanto das Letras. Ali encontrei grandes mestres generosos, como os havia encontrado durante meu longo percurso acadêmico. Meu primeiro soneto – postado abaixo – saiu com a ajuda do grande poeta sonetista Marcos Loures. Paulo Camelo, Ronaldo Rhusso, Rommel Werneck, Alexandre Tambelli, Dudu de Oliveira, além do luso Abílio Henrique, também muito me ensinaram e ampararam meus passos, estimulando-me a seguir adiante. Meu pai lia e relia meus “protótipos” de sonetos e me apontava os meus erros. Paulo Camelo me mandou seus livros sobre ritmo e poesia. Outros me indicaram bibliografia sobre teoria do verso, como os livros de Olavo Bilac (Tratado de Versificação) e de Rogério Chociay (Teoria do Verso). Estudei e estudei. Diógenes Pereira de Araújo me remeteu o seu livro Escandir. Escrevi perto de 100 sonetos em resposta aos sonetos de Marcos Loures (ele postava um soneto e eu respondia com outro, feito um repente). Aprendi muito com ele. Enfim, se hoje posso ser considerada sonetista, sou fruto da generosidade de vários mestres. E começaram a sair sonetos mancos, com pés quebrados (erros), ou truncados... Sim, porque no início estamos domando a técnica, que é um recurso de embelezamento do poema, mas que, por si só, não o garante. Depois, pouco a pouco, fui dominando os sons, os ritmos e comecei a perceber a melodia dos versos, sua sonoridade. Os meus estudos de piano e de harmonia ajudaram-me nisso. Somos eternos aprendizes! Até que um dia os versos nascem, brotam sem tropeçar na técnica. Sempre fui educadora, meu único ofício – professora universitária, professora de professores universitários, professora de professores leigos do meio rural, professora de professores indígenas – mas nunca deixei de ser aprendiz. Hoje estou a rever os meus primeiros 500 sonetos, observando meus erros, corrigindo-os. E sempre peço socorro aos meus mestres. Eu vivo a separar as silabas poéticas dos sonetos dos grandes sonetistas para aprimorar meus conhecimentos. Escrevo para dizer aos que estão iniciando nesse caminho, como eu em 2009: NÃO DESISTAM. Ninguém nasce sonetista, se aprende. Estejam abertos à critica construtiva. Um dia, quem sabe, alguém lerá um poema seu e dirá: belo soneto!
Edir Pina de Barros
Explode coração! *
Tua dor grita, explode coração
e não contenhas mais rompante grito,
explode forte e mata essa ilusão
assim sem compaixão ou triste rito.
Dá um cortante grito qual punhal
e cala a dor voraz que te calcina,
matando esta ilusão vem e, afinal,
enterra essa paixão que te alucina.
Sangra, sem dó, teus sonhos, teus lamentos,
na fonte, quebra teus padecimentos
que te farão verter o amargo pranto.
Enche-te, coração, de grã coragem,
desse amor tão ingrato, esgarça a imagem:
só resta a ti deixar quem feriu tanto!
Cuiabá, 3 de Março de 2009.
*Meu primeiro soneto
Edir Pina de Barros (Flor do Cerrado)
Enviado por Edir Pina de Barros (Flor do Cerrado) em 17/01/2015
Alterado em 19/01/2015