Dois amores
Dois amores que me deixam
entre a cruz e a fina espada,
e melúria fazem, queixam,
calada, não digo nada!
Pelos dois, enamorada,
eu fico assim sem saber
qual dos dois devo escolher;
(quisera em noite estrelada
pelos dois ser procurada,
e entre os dois, de amor, morrer).
Um é poeta que adoro,
repentista talentoso,
tem olhar tão perigoso,
que devagar eu exploro
(seus versos todos decoro)
tange a lira com fulgor,
trata-me com muito amor,
é carinhoso e atrevido,
e também é bem vivido,
e tem beijo abrasador.
Outro é caboclo da roça,
é fogoso e tão faceiro,
arrebata-me ligeiro,
colhe mel, traz e me adoça,
vive na aldeia, na choça,
excelente caçador,
que busca por meu calor,
põe flor em minha melena,
tem pele quente e morena,
vem e me emprenha de amor.
Diga lá, ó, minha gente,
o que é que eu posso fazer,
sem os dois não sei viver,
vou virar pobre indigente,
andar ao léu, tristemente.
Sem poesia eu não vivo,
sem meu cantador altivo,
sem o caçador, seu cheiro,
sei que vou morrer ligeiro,
os dois amores cultivo.
Está tudo tão perfeito,
gosto do cheiro da mata,
dos versos, de serenata,
de cada qual com seu jeito!
E se amor trago em meu peito
por que tanta confusão?
Trago os dois no coração
concedo amor por igual,
para mim tudo normal:
eu não vou escolher, não!
Cuiabá, 21 de Outubro de 2009.
Livro: REALEJO, páginas 57-58
Edir Pina de Barros (Flor do Cerrado)
Enviado por Edir Pina de Barros (Flor do Cerrado) em 21/10/2009
Alterado em 25/07/2020