Textos


Conquista (sextina)

Escuto gritos vindos lá na mata!
Estranhos tudo invadem casas, terras,
se apossam, das mulheres, incontidos,
depois de tanta luta e de cansaços,
o sangue de crianças derramado,
e um povo a padecer, demais aflito.
 
E tal violento encontro, tão maldito,
(que a ainda a tantos povos só maltrata)
ataque, de tocaia, inesperado,
e gritos se ecoando pelas serras,
cortando matas, rios, os espaços,
a suplicar clemência, são ouvidos.
 
Ao longe só se escutam os gemidos
de alguém demais ferido,  em tom aflito,
um corpo em meio a corpos, aos pedaços,
o sangue a borbulhar, igual cascata.
América! Que dor no peito encerras!
E quanto sonho, em ti, foi soterrado.
 
Até depois de tudo terminado,
alguns, sem dó, também foram feridos,
(pois são demais injustas essas guerras).
a dor, o pranto, em meio a tal  delito,
e nada, nos jornais, alguém relata,
nos bares só festejam os devassos.
 
E a história assim prossegue a largos passos,
e vai fechando o cerco injusto, errado,
os povos só debaixo da chibata,
sofrendo mil suplícios desmedidos,
(mas nada, não, se encontra ainda escrito)
e em volta, só se escutam motosserras...
 
Sem lares, chacinados e sem terras,
rendidos, sem lugar, quaisquer espaços,
assim nos meus poemas  tenho dito,
padece o índio, tão discriminado,
com fome, sem saúde desvalidos,
que a tua história – América – retrata.
 
E agora lutam tanto pelas terras,
valentes, incontidos, sem cansaços,
no espaço derramando o forte grito.
 
Cuiabá, 28 de Maio de 2009.

Livro: Cantos de Resistência, páginas 119 e 120


A sextina foi criada por Arnaut Daniel, no século XII, foi usada por alguns dos grandes poetas, como DantePetrarcaCamões, etc. No Brasil dela se utilizaram Jorge de LimaAmérico Jacó e outros. Compõe-se de seis sextetos e um terceto final, a coda. Utilizando versos decassilábicos, tem as palavras (ou as rimas) finais repetidas em todas as estrofes, num esquema pré-determinado. Assim, as palavras (ou rimas) que aparecem na primeira estrofe, na sequência de versos 1, 2, 3, 4, 5, 6, repetem-se na estrofe seguinte, na sequência 6, 1, 5, 2, 4, 3. E se faz na estrofe seguinte a sequência 6, 1, 5, 2, 4, 3 em relação à estrofe anterior. E assim até a sexta estrofe, finalizando os sextetos. O terceto final, ou coda, tem, em cada verso, no meio e no fim, marcando as sílabas tônicas, as palavras (ou rimas) utilizadas no poema todo, na posição em que se apresentaram na primeira estrofe. No ano de 2009 – quando estava aprendendo a fazer soneto – Marcos Loures, um dos meus mestres, me estimulou a escrever essa modalidade de forma fixa. E eu, atrevida, me embrenhei nas suas regras. E o que saiu foi isso.
Edir Pina de Barros (Flor do Cerrado)
Enviado por Edir Pina de Barros (Flor do Cerrado) em 28/05/2009
Alterado em 02/08/2020
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